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Uma cena

É de manhã. Não num lugar qualquer, mas no Rio. E não numa época qualquer, mas no outono. Outono no Rio. O ar é fino, quase frio, as pedras portuguesas da calçada estão úmidas. No alto, o céu já é de um azul escandaloso, mas o sol oblíquo ainda não conseguiu vencer os prédios e arrasta seus raios pelo mar, pelas praias, por cima das montanhas, longe dali. Não chegou à rua. E, naquele trecho, onde as amendoeiras trançam suas copas, ainda é quase madrugada.

Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.

É uma senhora de cabelos muito brancos, sentada em sua cadeira, na calçada. Na rua tranquila, de pouco movimento, não passa quase ninguém a essa hora, tão de manhãzinha. Nem carros, nem pessoas. O que há mais é o movimento dos porteiros e dos pássaros. Os primeiros, com suas vassouras e mangueiras, conversando sobre o futebol da véspera. Os segundos, cantando – dentro ou fora das gaiolas.

Mas, mesmo com tão pouco movimento, a senhora já está sentada muito ereta, com seu vestido estampado, de corte simples, suas sandálias. Tem o olhar atento, o sorriso pronto a cumprimentar quem surja. No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer- -se num aceno, quando alguém passar.

É uma cena bonita, eu acho. Cena que se repete todos os dias. Parece coisa de antigamente.

Parece. Não fosse por um detalhe. A senhora, sentada placidamente em sua cadeira na calçada, observando as manhãs, está atrás das grades.

Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades. Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal. Fez comentários vagos sobre as árvores crescidas no Aterro, sobre o excesso de gente e carros, tudo sem muita ênfase. Mas e essas grades, me perguntou, por que todas essas grades? E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.

Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora. Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente, junto ao jardim, em frente à portaria, por trás da proteção do gradil pintado com tinta cor de cobre. E essa cena tão singela, de sabor tão antigo, se desenrola assim, por trás de barras de ferro, que mesmo sendo de alumínio para não enferrujar são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe. Eu, da calçada, vejo-a sempre por entre as tiras verticais de metal, sua figura frágil me fazendo lembrar os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001

Esse texto, que se inicia a partir do cotidiano de uma velha senhora que tem por hábito sentar-se na calçada observando as manhãs, constrói uma crítica
  • A: ao abandono dos idosos que, na velhice, se veem sozinhos, sem o apoio e o carinho de sua família.
  • B: ao excesso de pessoas e carros nas ruas, que somente é percebido por quem se afasta da cidade por um tempo e retorna.
  • C: às cenas diárias que repetem costumes do passado, que há muito já deveriam ter sido abandonados pela população.
  • D: às grades, que hoje dominam o cenário das cidades e que foram sendo colocadas aos poucos ao redor de todos nós.
  • E: às autoridades de segurança pública, que não atuam em prol do direito de ir e vir, sem riscos, da população.

Uma cena

É de manhã. Não num lugar qualquer, mas no Rio. E não numa época qualquer, mas no outono. Outono no Rio. O ar é fino, quase frio, as pedras portuguesas da calçada estão úmidas. No alto, o céu já é de um azul escandaloso, mas o sol oblíquo ainda não conseguiu vencer os prédios e arrasta seus raios pelo mar, pelas praias, por cima das montanhas, longe dali. Não chegou à rua. E, naquele trecho, onde as amendoeiras trançam suas copas, ainda é quase madrugada.

Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.

É uma senhora de cabelos muito brancos, sentada em sua cadeira, na calçada. Na rua tranquila, de pouco movimento, não passa quase ninguém a essa hora, tão de manhãzinha. Nem carros, nem pessoas. O que há mais é o movimento dos porteiros e dos pássaros. Os primeiros, com suas vassouras e mangueiras, conversando sobre o futebol da véspera. Os segundos, cantando – dentro ou fora das gaiolas.

Mas, mesmo com tão pouco movimento, a senhora já está sentada muito ereta, com seu vestido estampado, de corte simples, suas sandálias. Tem o olhar atento, o sorriso pronto a cumprimentar quem surja. No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer- -se num aceno, quando alguém passar.

É uma cena bonita, eu acho. Cena que se repete todos os dias. Parece coisa de antigamente.

Parece. Não fosse por um detalhe. A senhora, sentada placidamente em sua cadeira na calçada, observando as manhãs, está atrás das grades.

Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades. Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal. Fez comentários vagos sobre as árvores crescidas no Aterro, sobre o excesso de gente e carros, tudo sem muita ênfase. Mas e essas grades, me perguntou, por que todas essas grades? E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.

Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora. Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente, junto ao jardim, em frente à portaria, por trás da proteção do gradil pintado com tinta cor de cobre. E essa cena tão singela, de sabor tão antigo, se desenrola assim, por trás de barras de ferro, que mesmo sendo de alumínio para não enferrujar são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe. Eu, da calçada, vejo-a sempre por entre as tiras verticais de metal, sua figura frágil me fazendo lembrar os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001

O texto apresenta-se dividido em dois momentos: o primeiro, em que o narrador descreve minuciosamente a cena observada; e o segundo, em que o narrador se aproxima mais do leitor, estabelecendo, com ele, uma quase conversa e colocando-se explicitamente no texto.

O início do segundo momento se dá com o trecho:
  • A: “Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.” (parágrafo 2)
  • B: “No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer-se num aceno, quando alguém passar.” (parágrafo 4)
  • C: “É uma cena bonita, eu acho.” (parágrafo 5)
  • D: “Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades.” (parágrafo 7)
  • E: “Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora.” (parágrafo 8)

Uma cena

É de manhã. Não num lugar qualquer, mas no Rio. E não numa época qualquer, mas no outono. Outono no Rio. O ar é fino, quase frio, as pedras portuguesas da calçada estão úmidas. No alto, o céu já é de um azul escandaloso, mas o sol oblíquo ainda não conseguiu vencer os prédios e arrasta seus raios pelo mar, pelas praias, por cima das montanhas, longe dali. Não chegou à rua. E, naquele trecho, onde as amendoeiras trançam suas copas, ainda é quase madrugada.

Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.

É uma senhora de cabelos muito brancos, sentada em sua cadeira, na calçada. Na rua tranquila, de pouco movimento, não passa quase ninguém a essa hora, tão de manhãzinha. Nem carros, nem pessoas. O que há mais é o movimento dos porteiros e dos pássaros. Os primeiros, com suas vassouras e mangueiras, conversando sobre o futebol da véspera. Os segundos, cantando – dentro ou fora das gaiolas.

Mas, mesmo com tão pouco movimento, a senhora já está sentada muito ereta, com seu vestido estampado, de corte simples, suas sandálias. Tem o olhar atento, o sorriso pronto a cumprimentar quem surja. No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer- -se num aceno, quando alguém passar.

É uma cena bonita, eu acho. Cena que se repete todos os dias. Parece coisa de antigamente.

Parece. Não fosse por um detalhe. A senhora, sentada placidamente em sua cadeira na calçada, observando as manhãs, está atrás das grades.

Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades. Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal. Fez comentários vagos sobre as árvores crescidas no Aterro, sobre o excesso de gente e carros, tudo sem muita ênfase. Mas e essas grades, me perguntou, por que todas essas grades? E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.

Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora. Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente, junto ao jardim, em frente à portaria, por trás da proteção do gradil pintado com tinta cor de cobre. E essa cena tão singela, de sabor tão antigo, se desenrola assim, por trás de barras de ferro, que mesmo sendo de alumínio para não enferrujar são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe. Eu, da calçada, vejo-a sempre por entre as tiras verticais de metal, sua figura frágil me fazendo lembrar os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001

No trecho “Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal” (parágrafo 7), a relação semântica construída entre as duas orações pode ser explicitada pelo conector
  • A: porém
  • B: porque
  • C: entretanto
  • D: a fim de que
  • E: apesar de que

Uma cena

É de manhã. Não num lugar qualquer, mas no Rio. E não numa época qualquer, mas no outono. Outono no Rio. O ar é fino, quase frio, as pedras portuguesas da calçada estão úmidas. No alto, o céu já é de um azul escandaloso, mas o sol oblíquo ainda não conseguiu vencer os prédios e arrasta seus raios pelo mar, pelas praias, por cima das montanhas, longe dali. Não chegou à rua. E, naquele trecho, onde as amendoeiras trançam suas copas, ainda é quase madrugada.

Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.

É uma senhora de cabelos muito brancos, sentada em sua cadeira, na calçada. Na rua tranquila, de pouco movimento, não passa quase ninguém a essa hora, tão de manhãzinha. Nem carros, nem pessoas. O que há mais é o movimento dos porteiros e dos pássaros. Os primeiros, com suas vassouras e mangueiras, conversando sobre o futebol da véspera. Os segundos, cantando – dentro ou fora das gaiolas.

Mas, mesmo com tão pouco movimento, a senhora já está sentada muito ereta, com seu vestido estampado, de corte simples, suas sandálias. Tem o olhar atento, o sorriso pronto a cumprimentar quem surja. No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer- -se num aceno, quando alguém passar.

É uma cena bonita, eu acho. Cena que se repete todos os dias. Parece coisa de antigamente.

Parece. Não fosse por um detalhe. A senhora, sentada placidamente em sua cadeira na calçada, observando as manhãs, está atrás das grades.

Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades. Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal. Fez comentários vagos sobre as árvores crescidas no Aterro, sobre o excesso de gente e carros, tudo sem muita ênfase. Mas e essas grades, me perguntou, por que todas essas grades? E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.

Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora. Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente, junto ao jardim, em frente à portaria, por trás da proteção do gradil pintado com tinta cor de cobre. E essa cena tão singela, de sabor tão antigo, se desenrola assim, por trás de barras de ferro, que mesmo sendo de alumínio para não enferrujar são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe. Eu, da calçada, vejo-a sempre por entre as tiras verticais de metal, sua figura frágil me fazendo lembrar os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001

O emprego do pronome oblíquo em destaque respeita a norma-padrão da língua em:
  • A: Quando perguntaram sobre as grades, fiquei sem saber o que lhes dizer.
  • B: O sol oblíquo nasce atrás dos prédios, mas ainda não conseguiu vencer-lhes.
  • C: A velha senhora está sempre lá. Já espero lhe ver quando saio todas as manhãs.
  • D: Ainda demora para o sol nascer, mas, mesmo assim, a velha senhora já está lá a lhe esperar.
  • E: Quando as pessoas passam na calçada, aquela senhora tem o sorriso pronto para lhes cumprimentar.

Uma cena

É de manhã. Não num lugar qualquer, mas no Rio. E não numa época qualquer, mas no outono. Outono no Rio. O ar é fino, quase frio, as pedras portuguesas da calçada estão úmidas. No alto, o céu já é de um azul escandaloso, mas o sol oblíquo ainda não conseguiu vencer os prédios e arrasta seus raios pelo mar, pelas praias, por cima das montanhas, longe dali. Não chegou à rua. E, naquele trecho, onde as amendoeiras trançam suas copas, ainda é quase madrugada.

Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.

É uma senhora de cabelos muito brancos, sentada em sua cadeira, na calçada. Na rua tranquila, de pouco movimento, não passa quase ninguém a essa hora, tão de manhãzinha. Nem carros, nem pessoas. O que há mais é o movimento dos porteiros e dos pássaros. Os primeiros, com suas vassouras e mangueiras, conversando sobre o futebol da véspera. Os segundos, cantando – dentro ou fora das gaiolas.

Mas, mesmo com tão pouco movimento, a senhora já está sentada muito ereta, com seu vestido estampado, de corte simples, suas sandálias. Tem o olhar atento, o sorriso pronto a cumprimentar quem surja. No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer- -se num aceno, quando alguém passar.

É uma cena bonita, eu acho. Cena que se repete todos os dias. Parece coisa de antigamente.

Parece. Não fosse por um detalhe. A senhora, sentada placidamente em sua cadeira na calçada, observando as manhãs, está atrás das grades.

Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades. Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal. Fez comentários vagos sobre as árvores crescidas no Aterro, sobre o excesso de gente e carros, tudo sem muita ênfase. Mas e essas grades, me perguntou, por que todas essas grades? E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.

Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora. Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente, junto ao jardim, em frente à portaria, por trás da proteção do gradil pintado com tinta cor de cobre. E essa cena tão singela, de sabor tão antigo, se desenrola assim, por trás de barras de ferro, que mesmo sendo de alumínio para não enferrujar são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe. Eu, da calçada, vejo-a sempre por entre as tiras verticais de metal, sua figura frágil me fazendo lembrar os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001

De acordo com a norma-padrão da língua portuguesa, o emprego adequado da vírgula está plenamente atendido em:
  • A: O outono que o Rio nos oferece, tem um ar fino, quase frio.
  • B: Uma senhora de cabelos muito brancos, ficava sentada, em uma cadeira.
  • C: Ele se incomodou, com as grades do Rio.
  • D: Todos os dias que passo pelo Aterro vejo, as árvores cada vez mais crescidas.
  • E: O porteiro, que prende passarinhos em gaiolas, não vê que o outono fica mais lindo quando estamos livres.

Uma cena

É de manhã. Não num lugar qualquer, mas no Rio. E não numa época qualquer, mas no outono. Outono no Rio. O ar é fino, quase frio, as pedras portuguesas da calçada estão úmidas. No alto, o céu já é de um azul escandaloso, mas o sol oblíquo ainda não conseguiu vencer os prédios e arrasta seus raios pelo mar, pelas praias, por cima das montanhas, longe dali. Não chegou à rua. E, naquele trecho, onde as amendoeiras trançam suas copas, ainda é quase madrugada.

Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.

É uma senhora de cabelos muito brancos, sentada em sua cadeira, na calçada. Na rua tranquila, de pouco movimento, não passa quase ninguém a essa hora, tão de manhãzinha. Nem carros, nem pessoas. O que há mais é o movimento dos porteiros e dos pássaros. Os primeiros, com suas vassouras e mangueiras, conversando sobre o futebol da véspera. Os segundos, cantando – dentro ou fora das gaiolas.

Mas, mesmo com tão pouco movimento, a senhora já está sentada muito ereta, com seu vestido estampado, de corte simples, suas sandálias. Tem o olhar atento, o sorriso pronto a cumprimentar quem surja. No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer- -se num aceno, quando alguém passar.

É uma cena bonita, eu acho. Cena que se repete todos os dias. Parece coisa de antigamente.

Parece. Não fosse por um detalhe. A senhora, sentada placidamente em sua cadeira na calçada, observando as manhãs, está atrás das grades.

Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades. Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal. Fez comentários vagos sobre as árvores crescidas no Aterro, sobre o excesso de gente e carros, tudo sem muita ênfase. Mas e essas grades, me perguntou, por que todas essas grades? E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.

Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora. Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente, junto ao jardim, em frente à portaria, por trás da proteção do gradil pintado com tinta cor de cobre. E essa cena tão singela, de sabor tão antigo, se desenrola assim, por trás de barras de ferro, que mesmo sendo de alumínio para não enferrujar são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe. Eu, da calçada, vejo-a sempre por entre as tiras verticais de metal, sua figura frágil me fazendo lembrar os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001

A frase na qual o que cumpre somente a função de promover a continuidade do texto sem acumular a função de retomar um antecedente é:
  • A: “Cena que se repete todos os dias”. (parágrafo 5)
  • B: “eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada”. (parágrafo 7)
  • C: “Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente”. (parágrafo 8)
  • D: “são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe.” (parágrafo 8)
  • E: “os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.” (parágrafo 9)

Uma cena

É de manhã. Não num lugar qualquer, mas no Rio. E não numa época qualquer, mas no outono. Outono no Rio. O ar é fino, quase frio, as pedras portuguesas da calçada estão úmidas. No alto, o céu já é de um azul escandaloso, mas o sol oblíquo ainda não conseguiu vencer os prédios e arrasta seus raios pelo mar, pelas praias, por cima das montanhas, longe dali. Não chegou à rua. E, naquele trecho, onde as amendoeiras trançam suas copas, ainda é quase madrugada.

Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.

É uma senhora de cabelos muito brancos, sentada em sua cadeira, na calçada. Na rua tranquila, de pouco movimento, não passa quase ninguém a essa hora, tão de manhãzinha. Nem carros, nem pessoas. O que há mais é o movimento dos porteiros e dos pássaros. Os primeiros, com suas vassouras e mangueiras, conversando sobre o futebol da véspera. Os segundos, cantando – dentro ou fora das gaiolas.

Mas, mesmo com tão pouco movimento, a senhora já está sentada muito ereta, com seu vestido estampado, de corte simples, suas sandálias. Tem o olhar atento, o sorriso pronto a cumprimentar quem surja. No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer- -se num aceno, quando alguém passar.

É uma cena bonita, eu acho. Cena que se repete todos os dias. Parece coisa de antigamente.

Parece. Não fosse por um detalhe. A senhora, sentada placidamente em sua cadeira na calçada, observando as manhãs, está atrás das grades.

Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades. Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal. Fez comentários vagos sobre as árvores crescidas no Aterro, sobre o excesso de gente e carros, tudo sem muita ênfase. Mas e essas grades, me perguntou, por que todas essas grades? E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.

Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora. Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente, junto ao jardim, em frente à portaria, por trás da proteção do gradil pintado com tinta cor de cobre. E essa cena tão singela, de sabor tão antigo, se desenrola assim, por trás de barras de ferro, que mesmo sendo de alumínio para não enferrujar são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe. Eu, da calçada, vejo-a sempre por entre as tiras verticais de metal, sua figura frágil me fazendo lembrar os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001

Para atender aos padrões de escrita formal do português, observando-se a norma-padrão, o acento grave indicativo da crase deve ser empregado em:
  • A: A paisagem a qual descrevi me deslumbra até hoje.
  • B: Não havia ninguém na rua quando a manhã se descortinou.
  • C: Meu irmão demonstrava surpresa sempre que via as grades.
  • D: A velha senhora tem o olhar atento as belas paisagens da cidade.
  • E: Minha percepção sobre o Rio mudou a partir da visão daquela senhora.

Uma cena

É de manhã. Não num lugar qualquer, mas no Rio. E não numa época qualquer, mas no outono. Outono no Rio. O ar é fino, quase frio, as pedras portuguesas da calçada estão úmidas. No alto, o céu já é de um azul escandaloso, mas o sol oblíquo ainda não conseguiu vencer os prédios e arrasta seus raios pelo mar, pelas praias, por cima das montanhas, longe dali. Não chegou à rua. E, naquele trecho, onde as amendoeiras trançam suas copas, ainda é quase madrugada.

Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.

É uma senhora de cabelos muito brancos, sentada em sua cadeira, na calçada. Na rua tranquila, de pouco movimento, não passa quase ninguém a essa hora, tão de manhãzinha. Nem carros, nem pessoas. O que há mais é o movimento dos porteiros e dos pássaros. Os primeiros, com suas vassouras e mangueiras, conversando sobre o futebol da véspera. Os segundos, cantando – dentro ou fora das gaiolas.

Mas, mesmo com tão pouco movimento, a senhora já está sentada muito ereta, com seu vestido estampado, de corte simples, suas sandálias. Tem o olhar atento, o sorriso pronto a cumprimentar quem surja. No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer- -se num aceno, quando alguém passar.

É uma cena bonita, eu acho. Cena que se repete todos os dias. Parece coisa de antigamente.

Parece. Não fosse por um detalhe. A senhora, sentada placidamente em sua cadeira na calçada, observando as manhãs, está atrás das grades.

Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades. Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal. Fez comentários vagos sobre as árvores crescidas no Aterro, sobre o excesso de gente e carros, tudo sem muita ênfase. Mas e essas grades, me perguntou, por que todas essas grades? E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.

Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora. Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente, junto ao jardim, em frente à portaria, por trás da proteção do gradil pintado com tinta cor de cobre. E essa cena tão singela, de sabor tão antigo, se desenrola assim, por trás de barras de ferro, que mesmo sendo de alumínio para não enferrujar são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe. Eu, da calçada, vejo-a sempre por entre as tiras verticais de metal, sua figura frágil me fazendo lembrar os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001

“E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.” (parágrafo 7)

O uso do verbo em destaque no pretérito mais-que-perfeito simples do indicativo estabelece que o fato representado por esse verbo se deu antes de outro fato passado.
Esse mesmo significado é encontrado no que está destacado em:
  • A: Ela já foi uma mulher alegre e jovial.
  • B: A mesma cena se repete ao nascer de cada manhã.
  • C: A velha senhora estava sentada na calçada enquanto amanhecia
  • D: Na última manhã, a velha senhora chegou e o sol já tinha surgido.
  • E: As grades impressionariam qualquer um que chegasse à cidade.

Uma cena

É de manhã. Não num lugar qualquer, mas no Rio. E não numa época qualquer, mas no outono. Outono no Rio. O ar é fino, quase frio, as pedras portuguesas da calçada estão úmidas. No alto, o céu já é de um azul escandaloso, mas o sol oblíquo ainda não conseguiu vencer os prédios e arrasta seus raios pelo mar, pelas praias, por cima das montanhas, longe dali. Não chegou à rua. E, naquele trecho, onde as amendoeiras trançam suas copas, ainda é quase madrugada.

Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.

É uma senhora de cabelos muito brancos, sentada em sua cadeira, na calçada. Na rua tranquila, de pouco movimento, não passa quase ninguém a essa hora, tão de manhãzinha. Nem carros, nem pessoas. O que há mais é o movimento dos porteiros e dos pássaros. Os primeiros, com suas vassouras e mangueiras, conversando sobre o futebol da véspera. Os segundos, cantando – dentro ou fora das gaiolas.

Mas, mesmo com tão pouco movimento, a senhora já está sentada muito ereta, com seu vestido estampado, de corte simples, suas sandálias. Tem o olhar atento, o sorriso pronto a cumprimentar quem surja. No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer- -se num aceno, quando alguém passar.

É uma cena bonita, eu acho. Cena que se repete todos os dias. Parece coisa de antigamente.

Parece. Não fosse por um detalhe. A senhora, sentada placidamente em sua cadeira na calçada, observando as manhãs, está atrás das grades.

Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades. Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal. Fez comentários vagos sobre as árvores crescidas no Aterro, sobre o excesso de gente e carros, tudo sem muita ênfase. Mas e essas grades, me perguntou, por que todas essas grades? E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.

Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora. Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente, junto ao jardim, em frente à portaria, por trás da proteção do gradil pintado com tinta cor de cobre. E essa cena tão singela, de sabor tão antigo, se desenrola assim, por trás de barras de ferro, que mesmo sendo de alumínio para não enferrujar são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe. Eu, da calçada, vejo-a sempre por entre as tiras verticais de metal, sua figura frágil me fazendo lembrar os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001

A redação oficial tem como atributo a clareza, não se admitindo, para os textos, mais de um entendimento possível.
A frase que teria de ser reescrita para se adequar a essa regra da escrita oficial é
  • A: O porteiro ajudou a velha senhora a se sentar sob as árvores.
  • B: Todas as manhãs, aquela senhora observava os pássaros cantando.
  • C: A população da cidade do Rio precisa cuidar melhor dos espaços públicos.
  • D: O pedido da população por mais segurança será discutido pelos vereadores.
  • E: Observando o sol e o mar, o poeta escolheu o tema para um novo poema.

Uma cena

É de manhã. Não num lugar qualquer, mas no Rio. E não numa época qualquer, mas no outono. Outono no Rio. O ar é fino, quase frio, as pedras portuguesas da calçada estão úmidas. No alto, o céu já é de um azul escandaloso, mas o sol oblíquo ainda não conseguiu vencer os prédios e arrasta seus raios pelo mar, pelas praias, por cima das montanhas, longe dali. Não chegou à rua. E, naquele trecho, onde as amendoeiras trançam suas copas, ainda é quase madrugada.

Mesmo assim, ela já está lá – como se à espera do sol.

É uma senhora de cabelos muito brancos, sentada em sua cadeira, na calçada. Na rua tranquila, de pouco movimento, não passa quase ninguém a essa hora, tão de manhãzinha. Nem carros, nem pessoas. O que há mais é o movimento dos porteiros e dos pássaros. Os primeiros, com suas vassouras e mangueiras, conversando sobre o futebol da véspera. Os segundos, cantando – dentro ou fora das gaiolas.

Mas, mesmo com tão pouco movimento, a senhora já está sentada muito ereta, com seu vestido estampado, de corte simples, suas sandálias. Tem o olhar atento, o sorriso pronto a cumprimentar quem surja. No braço da cadeira de plástico branco, sua mão repousa, mas também parece pronta a erguer- -se num aceno, quando alguém passar.

É uma cena bonita, eu acho. Cena que se repete todos os dias. Parece coisa de antigamente.

Parece. Não fosse por um detalhe. A senhora, sentada placidamente em sua cadeira na calçada, observando as manhãs, está atrás das grades.

Meu irmão, que foi morar fora do Brasil e ficou 15 anos sem vir aqui, ao voltar só teve um choque: as grades. Nada mais o impressionou, tudo ele achou normal. Fez comentários vagos sobre as árvores crescidas no Aterro, sobre o excesso de gente e carros, tudo sem muita ênfase. Mas e essas grades, me perguntou, por que todas essas grades? E eu, espantada com seu espanto, eu que de certa forma já me acostumara à paisagem gradeada, fiquei sem saber o que dizer.

Penso nisso agora, ao passar pela rua e ver aquela senhora. Todos os dias, o porteiro coloca ali a cadeira para que ela se sente, junto ao jardim, em frente à portaria, por trás da proteção do gradil pintado com tinta cor de cobre. E essa cena tão singela, de sabor tão antigo, se desenrola assim, por trás de barras de ferro, que mesmo sendo de alumínio para não enferrujar são de um ferro simbólico, que prende, constrange, restringe. Eu, da calçada, vejo-a sempre por entre as tiras verticais de metal, sua figura frágil me fazendo lembrar os passarinhos que os porteiros guardam nas gaiolas, pendurados nas árvores.

SEIXAS, Heloisa. Contos mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001

O caráter público dos textos oficiais exige que eles sejam escritos de forma estritamente impessoal, característica que se observa em:
  • A: Considero, portanto, o excesso de grades uma agressão à paisagem da cidade.
  • B: Lastimavelmente, o decreto regulamenta os casos de construção de prédios na orla.
  • C: Os porteiros têm direito a ter pausa para o almoço e a receber por horas extras trabalhadas.
  • D: Aprovou-se, na Câmara, a tão acertada lei que trata da colocação de grades em espaços públicos.
  • E: Foi ignorada, no documento, a excessiva preocupação dos parlamentares com o volume de carros nas ruas.

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