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                                                                             Tuíto, logo existo
 


        Não tenho Twitter nem estou no Facebook. A Constituição me permite isso. Todavia, há no Twitter um falso perfil meu, assim como de muitas pessoas. Certa vez uma senhora me disse com o olhar cheio de reconhecimento que sempre me lê no Twitter e que já interagiu muitas vezes comigo, para seu grande proveito intelectual. Tentei explicar que se tratava de um falso eu, mas ela olhou para mim como se estivesse dizendo que eu não sou eu. Se estava no Twitter, eu existia. Tuíto, logo existo.
        Não me preocupei em convencê-la porque, a despeito do que a senhora pensasse de mim, essa história não mudaria a história do mundo – aliás não mudaria sequer a minha própria história pessoal.
        A irrelevância das opiniões expressas no Twitter é que todos falam, e entre estes todos há quem acredite nas coisas mais insensatas. Falam de tudo e mais alguma coisa, um contradiz o outro e todos juntos não dão uma ideia do que pensam as pessoas, mas apenas do que pensam certos pensadores desarvorados.
        O Twitter é igual ao bar da esquina de qualquer cidadezinha ou periferia. Falam o idiota da aldeia, o pequeno proprietário que se considera perseguido pela receita, o médico do interior amargurado por não ter conseguido o diploma de uma grande universidade, o passante que já bebeu todas. Mas tudo se consome ali mesmo: os bate-bocas no bar nunca mudaram a política internacional. No geral, o que a maioria das pessoas pensa é apenas um dado estatístico no momento em que, depois de refletir, cada um vota – e vota pelas opiniões emitidas por outro alguém.
        Assim, o éter da internet é atravessado por opiniões irrelevantes, mesmo porque não é possível expressar magistralmente ideias em menos de cento e quarenta caracteres*.
(Umberto Eco. Pape satàn aleppe: Crônicas de uma sociedade líquida. Editora Record, Rio de Janeiro: 2017. Adaptado)

* antigo limite de caracteres para postagem de mensagens no Twitter
Assinale a alternativa cujo trecho em destaque na frase expressa uma condição para que um evento se realize.

  • A: Todavia, há no Twitter um falso perfil meu, assim como de muitas pessoas.
  • B: ... já interagiu muitas vezes comigo, para seu grande proveito intelectual.
  • C: ... não dão uma ideia do que pensam as pessoas, mas apenas do que pensam certos pensadores desarvorados.
  • D: Se estava no Twitter, eu existia.
  • E: Tuíto,logo existo.



                                                                             Tuíto, logo existo
 


        Não tenho Twitter nem estou no Facebook. A Constituição me permite isso. Todavia, há no Twitter um falso perfil meu, assim como de muitas pessoas. Certa vez uma senhora me disse com o olhar cheio de reconhecimento que sempre me lê no Twitter e que já interagiu muitas vezes comigo, para seu grande proveito intelectual. Tentei explicar que se tratava de um falso eu, mas ela olhou para mim como se estivesse dizendo que eu não sou eu. Se estava no Twitter, eu existia. Tuíto, logo existo.
        Não me preocupei em convencê-la porque, a despeito do que a senhora pensasse de mim, essa história não mudaria a história do mundo – aliás não mudaria sequer a minha própria história pessoal.
        A irrelevância das opiniões expressas no Twitter é que todos falam, e entre estes todos há quem acredite nas coisas mais insensatas. Falam de tudo e mais alguma coisa, um contradiz o outro e todos juntos não dão uma ideia do que pensam as pessoas, mas apenas do que pensam certos pensadores desarvorados.
        O Twitter é igual ao bar da esquina de qualquer cidadezinha ou periferia. Falam o idiota da aldeia, o pequeno proprietário que se considera perseguido pela receita, o médico do interior amargurado por não ter conseguido o diploma de uma grande universidade, o passante que já bebeu todas. Mas tudo se consome ali mesmo: os bate-bocas no bar nunca mudaram a política internacional. No geral, o que a maioria das pessoas pensa é apenas um dado estatístico no momento em que, depois de refletir, cada um vota – e vota pelas opiniões emitidas por outro alguém.
        Assim, o éter da internet é atravessado por opiniões irrelevantes, mesmo porque não é possível expressar magistralmente ideias em menos de cento e quarenta caracteres*.
(Umberto Eco. Pape satàn aleppe: Crônicas de uma sociedade líquida. Editora Record, Rio de Janeiro: 2017. Adaptado)

* antigo limite de caracteres para postagem de mensagens no Twitter



Assinale a alternativa em que a reescrita do trecho – Não me preocupei em convencê-la porque, a despeito do que a senhora pensasse de mim, essa história não mudaria a história do mundo... – permanece correta quanto ao emprego das vírgulas, de acordo com a norma-padrão da língua portuguesa


  • A: Já que, essa história não mudaria a história do mundo, a despeito do que a senhora pensasse de mim não me preocupei em convencê-la...
  • B: Já que essa história, não mudaria a história do mundo a despeito, do que a senhora pensasse de mim, não me preocupei em convencê-la...
  • C: Já que essa história não mudaria, a história do mundo a despeito do que a senhora pensasse de mim não me preocupei, em convencê-la...
  • D: Já que essa história não mudaria a história do mundo, a despeito do que a senhora, pensasse de mim não me preocupei em convencê-la...
  • E: Já que essa história não mudaria a história do mundo, a despeito do que a senhora pensasse de mim, não me preocupei em convencê-la...



Assinale a alternativa que preenche, correta e respectivamente, as lacunas do texto a seguir, conforme a norma-padrão da língua portuguesa.

Frequentemente ______________ , as opiniões manifestadas em redes sociais não raro_____________ inapropriadas. A falta de critério é uma constante, resultando na disseminação de conteúdos muitas vezes ____________ a determinadas pessoas ou a certos grupos que, quando muito _____________ para distrair, sem qualquer outra utilidade.

  • A: insipida ... mostra-se ... ofensivos ... serve
  • B: insípidas ... mostram-se ... ofensivos .... servem
  • C: insípidos ... mostra-se ... ofensivos ... servem
  • D: insípidas ... mostram-se ... ofensivo ... serve
  • E: insípida ... mostram-se ... ofensivo ... servem

                                                                  O cansaço democrático
 
        Quem disse que a democracia era eterna? Ninguém. Mas palpita ainda no coração do homem civilizado a crença de que essa forma de governo estará entre nós até ao fim dos tempos.
        Uma ideia tão otimista seria risível à luz da história do pensamento político. Platão é o exemplo mais extremo: a democracia faz parte de um movimento cíclico de regimes – e, para ele, é uma forma degenerada de governo.
        Depois da democracia, haverá um tirano para pôr ordem no pardieiro; e, depois do tirano, haverá novamente uma aristocracia, que será suplantada por uma timocracia, que será suplantada por uma oligarquia, até a democracia regressar. Nada perdura.
        É precisamente esse pensamento lúgubre que percorre uma moda editorial recente – livros sobre o fim, real ou imaginário, da democracia liberal.
        Em seu recente “How Democracy Ends”, David Runciman lida com os contornos desse hipotético fim: se a democracia chegar ao seu termo, não teremos uma repetição da década de 1930, defende. Não teremos violência de massas, movimentos armados, tanques nas ruas. Vivemos em sociedades radicalmente diferentes – mais afluentes, envelhecidas, conectadas. E, além disso, conhecemos o preço da brutalidade autoritária e totalitária. As nostalgias reacionárias são coisa de jovens: eles desejam o que ignoram e ignoram o que desejam.
        Mas se os “golpes tradicionais” são improváveis, há formas invisíveis de conseguir o mesmo objetivo: pela gradual suspensão da ordem legal; pelo recurso a eleições fraudulentas; pela marginalização dos freios e contrapesos do regime.
        A democracia só sobrevive porque somos capazes de gerir as nossas frustrações quando os resultados nos são desfavoráveis. Essa tolerância diminui de ano para ano.
        E diminui sob o chicote das redes sociais. Runciman acredita que o principal problema do mundo virtual está no poder praticamente ilimitado que os gigantes tecnológicos exercem sobre os usuários.
        Pessoalmente, o meu temor é outro: o poder praticamente ilimitado que os usuários exercem sobre os poderes Executivo, Legislativo e até Judiciário. A democracia representativa, como a expressão sugere, sempre foi um compromisso feliz entre a vontade do povo e a capacidade dos mais preparados de filtrar as irracionalidades do povo.
        O filtro perdeu-se com essa espécie de “democracia direta” que é exercida pela multidão sobre os agentes políticos.
        Para que não restem dúvidas: não acredito em formas de governo eternas. Mas, até prova em contrário, a democracia liberal é o único regime que garante a liberdade política e a dignidade pessoal dos indivíduos, bem como a prosperidade sustentada das suas sociedades. A história ilustra a tese.
        Mas a história do presente também nos mostra que cresce no Ocidente um certo “cansaço democrático”. E que partes crescentes do eleitorado, por ignorância ou desespero, estão dispostas a trocar a liberdade e a dignidade da democracia por expedientes mais radicais e securitários. Por quê?
        Devolvo a palavra a David Runciman. Para o autor, a democracia disseminou-se nos últimos dois séculos porque havia uma narrativa aspiracional a cumprir.
        Era necessário dar voz política a todos os cidadãos (pobres, mulheres, negros etc.) e integrá-los na mesma rede de direitos e deveres (a grande tarefa do pós-Segunda Guerra). Os Estados tinham ainda recursos materiais e institucionais para cumprir com razoável êxito esse programa. Eis a ironia: o cansaço democrático explica-se pelo sucesso da própria experiência democrática.
        Ninguém sabe como será o futuro dessa experiência – para Runciman, a democracia vive a crise da meia-idade. Resta saber se essa crise destrói o casamento ou o torna mais forte.
        É uma boa metáfora. Que convida a outra: o casamento só irá sobreviver se a maioria conseguir redescobrir, com novos olhos, as virtudes que permanecem no lar.
                                (João Pereira Coutinho. Disponível em:<https://www1.folha.uol.com.br/> . Acesso em: 24 jul 2018. Adaptado)

 
É correto afirmar que o texto discorre sobre a democracia
  • A: expondo criticamente fatores do mundo contemporâneo que têm colaborado para que haja um esmorecimento da crença em princípios democráticos, em favor de valores como segurança e posições extremadas.
  • B: traçando um quadro negativo da condição de permanência dos regimes democráticos nas sociedades modernas, ameaçados por movimentos de massas conscientizadas, que exigem medidas menos totalitárias.
  • C: afirmando a descrença na possibilidade de permanência desse sistema político, em razão das aspirações populares à real representatividade das massas nas instâncias de poder, independentemente de limites.
  • D: predizendo as consequências negativas da ação das redes sociais sobre os representantes do Estado, ação essa que ressuscita o reacionarismo, em nome da preservação do regime democrático.
  • E: expressando pontos de vista contrastantes acerca das bases que sustentam os sistemas democráticos, a fim de denunciar práticas sujeitas a controle da sociedade, para que não se perca de vista a vontade coletiva.

                                                                          O cansaço democrático
 
        Quem disse que a democracia era eterna? Ninguém. Mas palpita ainda no coração do homem civilizado a crença de que essa forma de governo estará entre nós até ao fim dos tempos.
        Uma ideia tão otimista seria risível à luz da história do pensamento político. Platão é o exemplo mais extremo: a democracia faz parte de um movimento cíclico de regimes – e, para ele, é uma forma degenerada de governo.
        Depois da democracia, haverá um tirano para pôr ordem no pardieiro; e, depois do tirano, haverá novamente uma aristocracia, que será suplantada por uma timocracia, que será suplantada por uma oligarquia, até a democracia regressar. Nada perdura.
        É precisamente esse pensamento lúgubre que percorre uma moda editorial recente – livros sobre o fim, real ou imaginário, da democracia liberal.
        Em seu recente “How Democracy Ends”, David Runciman lida com os contornos desse hipotético fim: se a democracia chegar ao seu termo, não teremos uma repetição da década de 1930, defende. Não teremos violência de massas, movimentos armados, tanques nas ruas. Vivemos em sociedades radicalmente diferentes – mais afluentes, envelhecidas, conectadas. E, além disso, conhecemos o preço da brutalidade autoritária e totalitária. As nostalgias reacionárias são coisa de jovens: eles desejam o que ignoram e ignoram o que desejam.
        Mas se os “golpes tradicionais” são improváveis, há formas invisíveis de conseguir o mesmo objetivo: pela gradual suspensão da ordem legal; pelo recurso a eleições fraudulentas; pela marginalização dos freios e contrapesos do regime.
        A democracia só sobrevive porque somos capazes de gerir as nossas frustrações quando os resultados nos são desfavoráveis. Essa tolerância diminui de ano para ano.
        E diminui sob o chicote das redes sociais. Runciman acredita que o principal problema do mundo virtual está no poder praticamente ilimitado que os gigantes tecnológicos exercem sobre os usuários.
        Pessoalmente, o meu temor é outro: o poder praticamente ilimitado que os usuários exercem sobre os poderes Executivo, Legislativo e até Judiciário. A democracia representativa, como a expressão sugere, sempre foi um compromisso feliz entre a vontade do povo e a capacidade dos mais preparados de filtrar as irracionalidades do povo.
        O filtro perdeu-se com essa espécie de “democracia direta” que é exercida pela multidão sobre os agentes políticos.
        Para que não restem dúvidas: não acredito em formas de governo eternas. Mas, até prova em contrário, a democracia liberal é o único regime que garante a liberdade política e a dignidade pessoal dos indivíduos, bem como a prosperidade sustentada das suas sociedades. A história ilustra a tese.
        Mas a história do presente também nos mostra que cresce no Ocidente um certo “cansaço democrático”. E que partes crescentes do eleitorado, por ignorância ou desespero, estão dispostas a trocar a liberdade e a dignidade da democracia por expedientes mais radicais e securitários. Por quê?
        Devolvo a palavra a David Runciman. Para o autor, a democracia disseminou-se nos últimos dois séculos porque havia uma narrativa aspiracional a cumprir.
        Era necessário dar voz política a todos os cidadãos (pobres, mulheres, negros etc.) e integrá-los na mesma rede de direitos e deveres (a grande tarefa do pós-Segunda Guerra). Os Estados tinham ainda recursos materiais e institucionais para cumprir com razoável êxito esse programa. Eis a ironia: o cansaço democrático explica-se pelo sucesso da própria experiência democrática.
        Ninguém sabe como será o futuro dessa experiência – para Runciman, a democracia vive a crise da meia-idade. Resta saber se essa crise destrói o casamento ou o torna mais forte.
        É uma boa metáfora. Que convida a outra: o casamento só irá sobreviver se a maioria conseguir redescobrir, com novos olhos, as virtudes que permanecem no lar.
                                (João Pereira Coutinho. Disponível em:<https://www1.folha.uol.com.br/> . Acesso em: 24 jul 2018. Adaptado)

 
Em relação ao papel exercido pelo mundo virtual sobre o sistema político, é correto afirmar que
  • A: Runciman entende que a pouca tolerância que se manifesta nas redes sociais é efeito da falta de controle estatal sobre aqueles que disponibilizam essas redes e fomentam a insatisfação dos usuários.
  • B: tanto o autor do texto quanto Runciman enxergam as redes sociais como forças capazes de intervir nas decisões políticas, seja em nome de indivíduos seja para atender a aspirações coletivas.
  • C: o autor do texto trata a reação dos usuários de redes sociais como força que se institucionaliza e se legitima em nome da defesa de interesses contrariados por decisões dos poderes públicos.
  • D: os usuários das redes sociais, segundo o autor do texto, atuam sobre os poderes estatais institucionalizados; já segundo Runciman, os usuários se submetem ao poder dos detentores das tecnologias dessas redes.
  • E: tanto o autor do texto quanto Runciman acreditam que os detentores das tecnologias das comunicações virtuais atuam para afirmar seu poder junto às massas, incentivando a intolerância e a irracionalidade.

                                                                          O cansaço democrático
 
        Quem disse que a democracia era eterna? Ninguém. Mas palpita ainda no coração do homem civilizado a crença de que essa forma de governo estará entre nós até ao fim dos tempos.
        Uma ideia tão otimista seria risível à luz da história do pensamento político. Platão é o exemplo mais extremo: a democracia faz parte de um movimento cíclico de regimes – e, para ele, é uma forma degenerada de governo.
        Depois da democracia, haverá um tirano para pôr ordem no pardieiro; e, depois do tirano, haverá novamente uma aristocracia, que será suplantada por uma timocracia, que será suplantada por uma oligarquia, até a democracia regressar. Nada perdura.
        É precisamente esse pensamento lúgubre que percorre uma moda editorial recente – livros sobre o fim, real ou imaginário, da democracia liberal.
        Em seu recente “How Democracy Ends”, David Runciman lida com os contornos desse hipotético fim: se a democracia chegar ao seu termo, não teremos uma repetição da década de 1930, defende. Não teremos violência de massas, movimentos armados, tanques nas ruas. Vivemos em sociedades radicalmente diferentes – mais afluentes, envelhecidas, conectadas. E, além disso, conhecemos o preço da brutalidade autoritária e totalitária. As nostalgias reacionárias são coisa de jovens: eles desejam o que ignoram e ignoram o que desejam.
        Mas se os “golpes tradicionais” são improváveis, há formas invisíveis de conseguir o mesmo objetivo: pela gradual suspensão da ordem legal; pelo recurso a eleições fraudulentas; pela marginalização dos freios e contrapesos do regime.
        A democracia só sobrevive porque somos capazes de gerir as nossas frustrações quando os resultados nos são desfavoráveis. Essa tolerância diminui de ano para ano.
        E diminui sob o chicote das redes sociais. Runciman acredita que o principal problema do mundo virtual está no poder praticamente ilimitado que os gigantes tecnológicos exercem sobre os usuários.
        Pessoalmente, o meu temor é outro: o poder praticamente ilimitado que os usuários exercem sobre os poderes Executivo, Legislativo e até Judiciário. A democracia representativa, como a expressão sugere, sempre foi um compromisso feliz entre a vontade do povo e a capacidade dos mais preparados de filtrar as irracionalidades do povo.
        O filtro perdeu-se com essa espécie de “democracia direta” que é exercida pela multidão sobre os agentes políticos.
        Para que não restem dúvidas: não acredito em formas de governo eternas. Mas, até prova em contrário, a democracia liberal é o único regime que garante a liberdade política e a dignidade pessoal dos indivíduos, bem como a prosperidade sustentada das suas sociedades. A história ilustra a tese.
        Mas a história do presente também nos mostra que cresce no Ocidente um certo “cansaço democrático”. E que partes crescentes do eleitorado, por ignorância ou desespero, estão dispostas a trocar a liberdade e a dignidade da democracia por expedientes mais radicais e securitários. Por quê?
        Devolvo a palavra a David Runciman. Para o autor, a democracia disseminou-se nos últimos dois séculos porque havia uma narrativa aspiracional a cumprir.
        Era necessário dar voz política a todos os cidadãos (pobres, mulheres, negros etc.) e integrá-los na mesma rede de direitos e deveres (a grande tarefa do pós-Segunda Guerra). Os Estados tinham ainda recursos materiais e institucionais para cumprir com razoável êxito esse programa. Eis a ironia: o cansaço democrático explica-se pelo sucesso da própria experiência democrática.
        Ninguém sabe como será o futuro dessa experiência – para Runciman, a democracia vive a crise da meia-idade. Resta saber se essa crise destrói o casamento ou o torna mais forte.
        É uma boa metáfora. Que convida a outra: o casamento só irá sobreviver se a maioria conseguir redescobrir, com novos olhos, as virtudes que permanecem no lar.
                                (João Pereira Coutinho. Disponível em:<https://www1.folha.uol.com.br/> . Acesso em: 24 jul 2018. Adaptado)

 
De acordo com a convicção do autor, o chamado “cansaço democrático” associa-se
  • A: à falta de motivação para mudar para outro regime mais liberal.
  • B: ao desapego das sociedades ocidentais em relação a valores comunitários.
  • C: à carência de ações políticas que demonstrem real preocupação com o povo.
  • D: ao adiamento constante de propostas que visem ao bem-estar dos governados.
  • E: à própria prática dos princípios da democracia pelas sociedades.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     O cansaço democrático
 
        Quem disse que a democracia era eterna? Ninguém. Mas palpita ainda no coração do homem civilizado a crença de que essa forma de governo estará entre nós até ao fim dos tempos.
        Uma ideia tão otimista seria risível à luz da história do pensamento político. Platão é o exemplo mais extremo: a democracia faz parte de um movimento cíclico de regimes – e, para ele, é uma forma degenerada de governo.
        Depois da democracia, haverá um tirano para pôr ordem no pardieiro; e, depois do tirano, haverá novamente uma aristocracia, que será suplantada por uma timocracia, que será suplantada por uma oligarquia, até a democracia regressar. Nada perdura.
        É precisamente esse pensamento lúgubre que percorre uma moda editorial recente – livros sobre o fim, real ou imaginário, da democracia liberal.
        Em seu recente “How Democracy Ends”, David Runciman lida com os contornos desse hipotético fim: se a democracia chegar ao seu termo, não teremos uma repetição da década de 1930, defende. Não teremos violência de massas, movimentos armados, tanques nas ruas. Vivemos em sociedades radicalmente diferentes – mais afluentes, envelhecidas, conectadas. E, além disso, conhecemos o preço da brutalidade autoritária e totalitária. As nostalgias reacionárias são coisa de jovens: eles desejam o que ignoram e ignoram o que desejam.
        Mas se os “golpes tradicionais” são improváveis, há formas invisíveis de conseguir o mesmo objetivo: pela gradual suspensão da ordem legal; pelo recurso a eleições fraudulentas; pela marginalização dos freios e contrapesos do regime.
        A democracia só sobrevive porque somos capazes de gerir as nossas frustrações quando os resultados nos são desfavoráveis. Essa tolerância diminui de ano para ano.
        E diminui sob o chicote das redes sociais. Runciman acredita que o principal problema do mundo virtual está no poder praticamente ilimitado que os gigantes tecnológicos exercem sobre os usuários.
        Pessoalmente, o meu temor é outro: o poder praticamente ilimitado que os usuários exercem sobre os poderes Executivo, Legislativo e até Judiciário. A democracia representativa, como a expressão sugere, sempre foi um compromisso feliz entre a vontade do povo e a capacidade dos mais preparados de filtrar as irracionalidades do povo.
        O filtro perdeu-se com essa espécie de “democracia direta” que é exercida pela multidão sobre os agentes políticos.
        Para que não restem dúvidas: não acredito em formas de governo eternas. Mas, até prova em contrário, a democracia liberal é o único regime que garante a liberdade política e a dignidade pessoal dos indivíduos, bem como a prosperidade sustentada das suas sociedades. A história ilustra a tese.
        Mas a história do presente também nos mostra que cresce no Ocidente um certo “cansaço democrático”. E que partes crescentes do eleitorado, por ignorância ou desespero, estão dispostas a trocar a liberdade e a dignidade da democracia por expedientes mais radicais e securitários. Por quê?
        Devolvo a palavra a David Runciman. Para o autor, a democracia disseminou-se nos últimos dois séculos porque havia uma narrativa aspiracional a cumprir.
        Era necessário dar voz política a todos os cidadãos (pobres, mulheres, negros etc.) e integrá-los na mesma rede de direitos e deveres (a grande tarefa do pós-Segunda Guerra). Os Estados tinham ainda recursos materiais e institucionais para cumprir com razoável êxito esse programa. Eis a ironia: o cansaço democrático explica-se pelo sucesso da própria experiência democrática.
        Ninguém sabe como será o futuro dessa experiência – para Runciman, a democracia vive a crise da meia-idade. Resta saber se essa crise destrói o casamento ou o torna mais forte.
        É uma boa metáfora. Que convida a outra: o casamento só irá sobreviver se a maioria conseguir redescobrir, com novos olhos, as virtudes que permanecem no lar.
                                (João Pereira Coutinho. Disponível em:<https://www1.folha.uol.com.br/> . Acesso em: 24 jul 2018. Adaptado)

 
No contexto dos dois últimos parágrafos, o autor faz referência a “uma boa metáfora”, figura de linguagem que se caracteriza por
  • A: associar, em uma só unidade, expressões que designam sensações relativas a diferentes órgãos dos sentidos.
  • B: aproximar termos contrários entre si, que coexistem e se associam numa mesma expressão.
  • C: estabelecer relações de similaridade entre termos, com base no compartilhamento de traços comuns de sentido.
  • D: atribuir qualificações e ações próprias do ser humano a seres não-humanos, transferindo a estes traços daqueles.
  • E: empregar expressões atenuadas para fazer referências que seriam consideradas chocantes ou grosseiras.




                                                                          O cansaço democrático

 
        Quem disse que a democracia era eterna? Ninguém. Mas palpita ainda no coração do homem civilizado a crença de que essa forma de governo estará entre nós até ao fim dos tempos.
        Uma ideia tão otimista seria risível à luz da história do pensamento político. Platão é o exemplo mais extremo: a democracia faz parte de um movimento cíclico de regimes – e, para ele, é uma forma degenerada de governo.
        Depois da democracia, haverá um tirano para pôr ordem no pardieiro; e, depois do tirano, haverá novamente uma aristocracia, que será suplantada por uma timocracia, que será suplantada por uma oligarquia, até a democracia regressar. Nada perdura.
        É precisamente esse pensamento lúgubre que percorre uma moda editorial recente – livros sobre o fim, real ou imaginário, da democracia liberal.
        Em seu recente “How Democracy Ends”, David Runciman lida com os contornos desse hipotético fim: se a democracia chegar ao seu termo, não teremos uma repetição da década de 1930, defende. Não teremos violência de massas, movimentos armados, tanques nas ruas. Vivemos em sociedades radicalmente diferentes – mais afluentes, envelhecidas, conectadas. E, além disso, conhecemos o preço da brutalidade autoritária e totalitária. As nostalgias reacionárias são coisa de jovens: eles desejam o que ignoram e ignoram o que desejam.
        Mas se os “golpes tradicionais” são improváveis, há formas invisíveis de conseguir o mesmo objetivo: pela gradual suspensão da ordem legal; pelo recurso a eleições fraudulentas; pela marginalização dos freios e contrapesos do regime.
        A democracia só sobrevive porque somos capazes de gerir as nossas frustrações quando os resultados nos são desfavoráveis. Essa tolerância diminui de ano para ano.
        E diminui sob o chicote das redes sociais. Runciman acredita que o principal problema do mundo virtual está no poder praticamente ilimitado que os gigantes tecnológicos exercem sobre os usuários.
        Pessoalmente, o meu temor é outro: o poder praticamente ilimitado que os usuários exercem sobre os poderes Executivo, Legislativo e até Judiciário. A democracia representativa, como a expressão sugere, sempre foi um compromisso feliz entre a vontade do povo e a capacidade dos mais preparados de filtrar as irracionalidades do povo.
        O filtro perdeu-se com essa espécie de “democracia direta” que é exercida pela multidão sobre os agentes políticos.
        Para que não restem dúvidas: não acredito em formas de governo eternas. Mas, até prova em contrário, a democracia liberal é o único regime que garante a liberdade política e a dignidade pessoal dos indivíduos, bem como a prosperidade sustentada das suas sociedades. A história ilustra a tese.
        Mas a história do presente também nos mostra que cresce no Ocidente um certo “cansaço democrático”. E que partes crescentes do eleitorado, por ignorância ou desespero, estão dispostas a trocar a liberdade e a dignidade da democracia por expedientes mais radicais e securitários. Por quê?
        Devolvo a palavra a David Runciman. Para o autor, a democracia disseminou-se nos últimos dois séculos porque havia uma narrativa aspiracional a cumprir.
        Era necessário dar voz política a todos os cidadãos (pobres, mulheres, negros etc.) e integrá-los na mesma rede de direitos e deveres (a grande tarefa do pós-Segunda Guerra). Os Estados tinham ainda recursos materiais e institucionais para cumprir com razoável êxito esse programa. Eis a ironia: o cansaço democrático explica-se pelo sucesso da própria experiência democrática.
        Ninguém sabe como será o futuro dessa experiência – para Runciman, a democracia vive a crise da meia-idade. Resta saber se essa crise destrói o casamento ou o torna mais forte.
        É uma boa metáfora. Que convida a outra: o casamento só irá sobreviver se a maioria conseguir redescobrir, com novos olhos, as virtudes que permanecem no lar.
(João Pereira Coutinho. Disponível em:<https://www1.folha.uol.com.br/> . Acesso em: 24 jul 2018. Adaptado)



Assinale a alternativa em que informações do texto são reescritas e estão em conformidade com a norma-padrão de concordância nominal e verbal.


  • A: Depois da democracia, haverão tiranos para porem ordem no pardieiro; e, depois deles, virão novamente os que se diz representante da aristocracia, que será suplantada por uma timocracia, que uma oligarquia suplantará, até que a democracia regresse e as s
  • B: Veem-se que os usuários tem poder sobre os poderes instituídos. A democracia representativa, tal qual sugerida pela expressão, sempre foi um compromisso entre o que a maioria das pessoas deseja e a capacidade de os mais preparados filtrar as irracionalid
  • C: Era necessária a voz política de todos os cidadãos se fazer ouvir; e igualmente sua integração na mesma rede de direitos e deveres. Ainda se podia encontrar, nos Estados, recursos materiais e institucionais bastantes para cumprir esse programa.
  • D: Considerados improváveis os “golpes tradicionais”, constatam-se existir formas o mais possíveis invisíveis de obter o mesmo objetivo: pela gradual suspensão da ordem legal; pelo recurso a eleições eivada de fraude; pela marginalização de bastante freios
  • E: Não deverá haver movimentos armados, tanques nas ruas, violência de massas. Vive-se em grupos sociais tidos como mais afluentes, envelhecidos, conectados. Já se conhecem os ônus da brutalidade autoritária e totalitária. Quanto às nostalgias reacionárias,

Assinale a alternativa que preenche as lacunas do trecho a seguir, de acordo com a norma-padrão de emprego do sinal indicativo de crase.

Esclareço _______ Vossa Senhoria que todo aquele que aspira __________ carreira pública, deve estar ciente de que terá de obedecer ________ normas legais, para melhor desempenhar suas funções. ________ que não se dispõem _______enfrentar decisões difíceis, aconselha-se desistir. _________ partir de bons princípios, será fácil chegar ________ consecução de seus ideais.

 
  • A: a … à … as … Àqueles … à … À … a
  • B: a … a … as … Aqueles … a … À … a
  • C: à … a … às … Aqueles … a … À … à
  • D: a … à … às … Àqueles … a … A … à
  • E: à … a … as … Aqueles … à … A … a




                                                                                   O valor da mentira

        Durante o conclave de 1522, que terminaria por ungir Adriano VI em papa, as estátuas no entorno da Piazza Navona, no centro de Roma, passaram a amanhecer com pequenos pedaços de papel pregados. Eram textos de autoria do escritor e poeta Pietro Aretino (1492-1556), já então uma das mais conhecidas “penas de aluguel” da Itália. Com seu estilo satírico e mordaz, inteligente e ferino, Aretino dedicava-se a atacar um por um dos cardeais que poderiam vir a ser o novo pontífice. Os ataques eram financiados pelo cardeal Giulio de Medici, que acabou se tornando o papa Clemente VII um ano depois, com a morte de Adriano VI. A partir daí, o gênero dos “panfletos difamatórios” ficou conhecido como “pasquim”. Aretino transformou a difamação em negócio e fez fortuna com os jornalecos.

        Em 2016, as mentiras veiculadas com o objetivo de beneficiar um indivíduo ou um grupo – ou simplesmente franquear ao seu disseminador o prazer de manipular multidões – ganharam o nome de fake news. Aquele foi o ano em que o mundo se surpreendeu com a vitória do Brexit no Reino Unido e também o ano em que, nos Estados Unidos, as redes sociais foram infestadas por textos que diziam que a então candidata democrata, Hillary Clinton, havia enviado armas para o Estado Islâmico, ou que o papa Francisco declarara apoio ao rival dela, o hoje presidente Donald Trump.

        Nas fake news não cabem relativismos nem discussões filosóficas sobre o conceito de “verdade” – trata-se, pura e simplesmente, de informações deliberadamente enganosas. São lorotas destinadas a ludibriar os incautos, ou os nem tão incautos assim, ávidos por pendurar seus argumentos em fatos que não podem ser comprovados. O suposto desconhecimento de uns, aliado ao oportunismo de outros, ampliou o significado da expressão de forma a adequá-lo a demandas de ocasião. Em prática recém-inaugurada, a expressão fake news passou a ser usada por poderosos para classificar tudo o que a imprensa profissional publica a respeito deles e que lhes desagrada – apesar de ser invariavelmente verdadeiro. Ajuda no sucesso dessa estratégia maliciosa a popularidade dos novos meios de comunicação nascidos com a internet.


(Anna Carolina Rodrigues, Veja, 26.10.2018. Adaptado)



É correto afirmar que a referência ao gênero praticado por Aretino
  • A: explica a preferência do grande público pelas notícias em rede, alimentando o gosto milenar por ataques pessoais indiscriminados.
  • B: pode ser um alerta para o grande público, para que reflita sobre a tradição da mentira praticada sem motivo aparente.
  • C: é um recurso de que lança mão a revista, com o objetivo de conferir maior credibilidade à matéria por ela veiculada.
  • D: ancora a sequência de ideias da autora, por associação com a prática contemporânea da manipulação por meio de conteúdos falsos.
  • E: serve de justificativa para o uso das redes sociais nos dias de hoje, apontando a precariedade dos recursos de que se valia o escritor.

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