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O “novo cangaço”: como a Segurança Pública deve entender o fenômeno?

Um grupo de homens fortemente armados de fuzis e explosivos, vestidos com coletes à prova de balas, chega em uma pequena cidade do interior. Eles cercam a cidade, rendem os policiais e iniciam um grande e espetacular assalto a banco. A ação, extremamente bem coordenada, é resultado, logicamente, de muito planejamento. Essa cena pode parecer saída de um filme de ação estadunidense, mas é, na verdade, ocorrência relativamente comum em terras tupiniquins. A esse fenômeno damos o nome de “novo cangaço”, em referência aos “cangaceiros” que, como os liderados por Lampião e Maria Bonita, dedicavam-se a saquear vilarejos, assaltar fazendas, aterrorizar populações e confrontar as forças de segurança estatais do nordeste brasileiro na primeira metade do século XX. Este é o tema de nossa coluna essa semana. Neste texto, abordo o modo de funcionamento do chamado “novo cangaço” e proponho uma reflexão sobre o que este tipo criminal nos diz sobre a máquina da Segurança Pública no nosso país. E começo com exemplos. Pois bem. Há menos de um mês, no dia 31 de outubro de 2021, uma operação policial contra um grupo de assaltantes culminou na morte de 26 homens no município de Varginha, em Minas Gerais. Os mortos eram integrantes de uma quadrilha especializada em assaltos a instituições financeiras em cidades de pequeno e médio porte, e estavam alojados em sítios nos arredores de Varginha quando foram surpreendidos pela polícia. Segundo informou a Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), o grupo se preparava para realizar grandes assaltos na região. Foram apreendidos materiais dignos de um arsenal bélico, incluindo metralhadoras ponto 50, que são capazes de derrubar aeronaves. A ação policial foi a mais letal já registrada
no país em casos relativos ao “novo cangaço” e teve grande repercussão midiática. Pouco antes, em 30 de agosto de 2021, cerca de 30 homens cercaram a cidade de Araçatuba, no interior paulista, fizeram reféns, espalharam 100 kg de explosivos pelas ruas da cidade, explodiram duas agências bancárias e invadiram uma terceira. Os explosivos, feitos de dinamite, eram acionados por celular ou por sensor de proximidade. Como se não fosse o suficiente, o grupo tinha também um drone, cuja utilidade era monitorar o movimento da polícia. Houve tiroteio e três pessoas morreram, duas delas moradoras da cidade, e a outra, integrante da quadrilha. No dia 07 de abril de 2021, uma agência bancária foi assaltada em Abaré, no interior baiano. Os assaltantes fizeram reféns, atearam fogo em automóveis e fizeram rondas pela cidade para impedir que moradores saíssem às ruas. Não houve feridos. Em 30 de novembro de 2020, aproximadamente 30 pessoas assaltaram uma agência bancária em Criciúma, Santa Catarina. Na ocasião, houve uma ação que incluiu o bloqueio de ruas de acesso à cidade, um ataque a tiros ao Batalhão da Polícia Militar, o uso de reféns como escudos humanos e o uso de, no mínimo, 200 kg de explosivos. Apenas uma semana antes, em 24 de novembro de 2020, cerca de 20 homens atacaram agências bancárias no centro de Araraquara, São Paulo. Antes disso, interditaram ruas com caminhões em chamas na tentativa (frustrada) de impedir que a polícia chegasse ao local. Houve troca de tiros, mas ninguém ficou ferido. Eu poderia seguir com os exemplos, mas acredito que a ideia já está clara: as ações realizadas pelo “novo cangaço” são iniciativas perpetradas por grupos grandes, munidos de sofisticados materiais de guerra, que planejam um assalto a ser realizado em instituição financeira de cidade pequena ou média, buscam neutralizar as polícias, exercem um domínio territorial momentâneo a partir do bloqueio de vias de acesso ao local, fazem reféns e tem como objetivo (muitas vezes alcançado) a apropriação de enormes quantias de dinheiro. (...)
(texto adaptado e extraído de: https://www.justificando.com/2021/11/26/o novo-cangaco-como-a-seguranca-publica-deve-entendero-fenomeno - acessado em 15.08.22)

Consta, expressamente, como ideias e conclusões trazidas pelo texto acima:
  • A: Longe de ser um empreendimento amador, o “novo cangaço” é uma articulação entre especialistas. Muito diferente do que ocorre em gangues de bairro ou em facções criminosas estabelecidas, os assaltantes se conectam em “coalisões temporárias”, sem uma identidade coletiva que os representem. As efêmeras articulações são construídas no próprio processo de planejamento do assalto. Com base nesse modo de operação, poderíamos, então, esquematizar os recursos mobilizados pelos “neocangaceiros” em torno de quatro grupos primordiais: 1) a capacidade de planejamento; 2) o capital humano especializado; e 3) o acesso a aparatos bélicos; e 4) os meios de lavagem de dinheiro. Todos eles dependem da articulação de uma rede criminal.
  • B: A pesquisadora Jania Perla Diógenes de Aquino, em entrevista concedida ao podcast do Centro de Estudos de Criminalidade a Segurança Pública da UFMG -o Crisp Entrevista -, afirma que os assaltos a instituições financeiras, diferentemente dos assaltos de rua, por exemplo, envolvem uma espécie de “elite do crime”. Isso porque, como surgiu em seu trabalho de campo, existe uma seleção de quem poderá integrar os grupos: são sujeitos entendidos como experientes, capazes de controlar as próprias emoções, confiáveis, racionais, discretos. Essas habilidades, desenvolvidas ao longo de trajetórias de vida no “crime”, são importantes para o sucesso da ação.
  • C: É preciso repensar a aplicação de pena de privação de liberdade a sujeitos condenados por esse tipo de assalto, em especial nos casos em que não há feridos, já que, longe de interromper o ciclo “neocangaceiro”, a cadeia o retroalimenta e e complexifica. Ou seja, acabamos por chegar, mais uma vez, à mesma conclusão que vem sendo incansavelmente repetida por estudiosos do campo da criminalidade e da Segurança Pública: se queremos, de fato, construir uma cultura de paz, devemos investir na prevenção e na inteligência, e tirar o foco da punição e do encarceramento.
  • D: A ideia trazida pelo autor do texto acerca das ações realizadas pelo novo cangaço é de que são iniciativas deflagradas por grandes grupos com materiais de guerra avançados, que planejam um assalto a ser realizado em instituição financeira de cidade pequena ou média, buscam neutralizar as polícias, exercem um domínio territorial momentâneo a partir do bloqueio de vias de acesso ao local, fazem reféns e tem como objetivo (muitas vezes alcançado) a apropriação de enormes quantias de dinheiro.

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