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            A nossa democracia é laica, mas nossas decisões políticas são tomadas sob a premissa de que Deus é – e sempre será – brasileiro. Queremos benefícios sem custos (e quem em sã consciência não quereria?).
            Exigimos que seja assim. Os custos hão de ser empurrados para algum momento indeterminado do futuro e cair sobre as costas de alguma entidade benévola não especificada, sem machucar ninguém. Algum dia alguém dá algum jeito e fica tudo certo. Deus resolve.
            A maioria dos brasileiros concorda com o controle de preço do diesel, e quer ainda o controle de preço da gasolina e do gás natural. Só não aceita ter que pagar a conta. A Petrobras que tenha um prejuízo. E quem vai cobri-lo? O Tesouro, essa entidade superior e fonte de riquezas.
            Não é um caso isolado. Todos pedem por mais gasto para suas causas e setores de preferência, sem nunca especificar quem vai ficar com a conta; essa fica para uma figura oculta, alguém com um bolso vasto e generoso. Há quem diga, inclusive, que o aumento de gastos vai aumentar a arrecadação; multiplicação milagrosa dos pães.
            Essa é a lógica que governa o Brasil desde 1500, consagrada na Constituição de 1988, tão pródiga em direitos para todo mundo. O direito é a manifestação do fiat* divino entre os homens: uma obrigação incondicional que a realidade – alguém – terá de dar algum jeito de cumprir.
         O problema é que acabou o “milagre econômico” – um crescimento acelerado e sem causas conhecidas, que ocorre apesar de todas as deficiências e entraves, esses sim muito bem conhecidos. Deus parece ter conseguido o green card** e nos abandonou.
            O que fazer? Uma alternativa é seguir confiando na intervenção divina até o fim, deixando o ajuste ao deus-dará. A corda estoura para o lado mais fraco, e voltamos ao caos primordial. A outra é ser impiedoso e olhar para a realidade com olhos de descrença.
            Para que alguns continuem ganhando, pessoas de carne e osso terão que pagar. E aí sim poderemos responder à pergunta que o Brasil é mestre em evitar: quem?
               O problema é que para as escamas caírem de nossos olhos também será necessário um milagre...
 
(Joel Pinheiro da Fonseca, Folha de S.Paulo, 12.06.2018. Adaptado)
 


*fiat: do latim, faça-se, haja; referência à frase bíblica: “faça-se a luz”.
** green card: cartão de residência permanente nos EUA.



Associando-se as afirmações contidas no penúltimo e no último parágrafo, é correto afirmar que, no último, o autor se vale de expressão em sentido
  • A: figurado, para defender a ideia de que é melhor ocultar o fato de que a conta de benefícios concedidos a uns poucos deva caber a muitos outros.
  • B: figurado, para afirmar a descrença na possibilidade de o brasileiro conscientizar-se de que é inevitável a população arcar com o ônus de concessões feitas a alguns.
  • C: figurado, para assegurar que o brasileiro precisa ver os efeitos de medidas econômicas tomadas sem amparo na constituição de 1988, contrariando, pois, direitos de todos.
  • D: próprio, para levar o leitor a perceber que milagres econômicos não se repetem e que é preciso que o enfrentamento da realidade seja assumido sem medo.
  • E: próprio, para contradizer a ideia de que o país atravessa uma fase de crise econômica, que o impede de ver as necessidades reais da parcela mais pobre da população.

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